Empresários de Cabo Verde preocupados com recrutamento de mão-de-obra para Portugal e Espanha - África 21 Digital

2022-10-15 04:51:43 By : Ms. Qiaomin Xu

O presidente da associação empresarial Cabo Verde Empresas, Andrea Benolli, afirmou que os sucessivos recrutamentos de trabalhadores cabo-verdianos, para vários setores em Portugal, põem “em risco a manutenção do nível de qualidade” e a produtividade.

“Do ponto de vista das empresas, significa que milhares de quadros formados e com experiência apurada ao longo dos anos terão de ser substituídos por outros mais ou menos preparados, mas sem experiência, pondo em risco a manutenção do nível de qualidade e dos índices de produtividade nos diversos setores económicos. Infelizmente, não há solução imediata para este problema”, alertou o empresário, num comunicado daquela associação, com sede na ilha do Sal.

“Não podemos simplesmente transferir o problema da emigração para as empresas, afirmando que elas devem criar as condições para que possam reter seus trabalhadores, aliás aumento dos salários. As empresas também estão sofrendo com a crise climática, a crise da seca, a crise da pandemia, a crise financeira etc. e não podemos pensar em ter de suportar também a crise da mão-de-obra”, acrescentou.

O responsável recordou que “as crises são muitas” e não é possível continuar a pedir o apoio do tecido empresarial, “após dois anos de pandemia e dívidas ainda para pagar”.

O Governo de Cabo Verde anunciou na semana passada que está a negociar com Portugal um acordo que garanta proteção e salvaguarda de direitos ao abrigo do contrato de trabalho para os trabalhadores cabo-verdianos que queiram aderir à mobilidade laboral.

O anúncio foi feito pelo primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, na sequência das ações de recrutamento de empresas portuguesas realizadas nos últimos dias em Cabo Verde, a última das quais em 04 de outubro, pela Auto Viação Feirense, que pretendia contratar 30 motoristas e que acabou por reunir à porta de um hotel da Praia várias centenas de candidatos de várias ilhas cabo-verdianas que se deslocaram propositadamente à capital.

Já em São Vicente, um anúncio de 100 empregos para Espanha e Portugal, na hotelaria e construção, recebeu mais de 1.200 candidaturas este mês e obrigou à suspensão do processo de recrutamento, entre outros casos que têm sido conhecidos nas últimas semanas.

“O Governo está a trabalhar com o Governo português para a definição de um acordo que garanta contrato de trabalho junto de empregadores, que garanta proteção e segurança social, proteção de assistência médica, medicamentosa que é derivado do sistema de segurança social para aqueles que querem fazer a mobilidade laboral para Portugal, possam fazê-lo dentro de um quadro que garanta direitos”, disse o chefe do Governo, questionado pelos jornalistas.

Sem entrar em detalhes, Ulisses Correia e Silva afirmou que esse acordo deverá ser assinado em breve com as autoridades portuguesas, mas advertiu que os cidadãos que tentarem a emigração para Portugal através de outros expedientes não serão abrangidos por este quadro de cooperação, integração e de garantia de direitos, tendo de “assumir os seus riscos”.

“Garantir a igualdade de condições, incluindo económicas, para os trabalhadores cabo-verdianos em relação aos trabalhadores portugueses, é essencial para evitar a discriminação económica e social de quem emigra. Será um excelente acordo bilateral que poderá ser replicado com outros países estrangeiros e alinhado às sugestões da Organização Internacional do Trabalho”, considerou, a propósito, o presidente da Cabo Verde Empresas.

Contudo, Andrea Benolli alertou que “é difícil identificar parâmetros quantitativos neste tipo de acordo e mais difícil ainda será o controle por parte das autoridades responsáveis para garantir que sejam respeitados”, mas que vai aguardar a divulgação para avaliar os detalhes.

“Confiamos na capacidade dos respetivos Governos de fazer o máximo para que estas garantias não sejam apenas definidas no papel, mas sobretudo implementadas na prática, controladas e eventualmente sancionadas as empresas que as não apliquem. Uma vez garantidos os direitos dos trabalhadores migrantes, a questão da frente empresarial e social fica obviamente em aberto”, afirmou.

O responsável reconheceu que “há uma necessidade quase fisiológica que leva milhares de homens e mulheres cabo-verdianas a querer emigrar, em busca de melhores condições de vida”, no entanto, a “prioridade estratégica deve ser a oferta de uma vida melhor em Cabo Verde, capaz de reduzir a atual distância com os países economicamente mais desenvolvidos”.

“Do ponto de vista da gestão das finanças públicas, significa que os países que acolherão os nossos emigrantes beneficiarão da formação cabo-verdiana, paga através de empréstimos da cooperação internacional. Empréstimos que serão pagos pelas empresas cabo-verdianas e pelos cidadãos residentes”, acrescentou.

O Presidente cabo-verdiano afirmou na terça-feira que é tempo de fazer “profundas mudanças” e que “urge cumprir a Constituição”, defendendo que a emigração não deve acontecer por falta de oportunidades.

“Para os nossos jovens, a procura de um modo de vida num outro país tem de ser por opção. Não porque as oportunidades não existam ou, muito menos ainda, por perda de esperança no país. Ou seja, também deste ponto de vista, é fundamental indagar se estamos a cumprir a Constituição”, afirmou José Maria Neves.

O arquipélago enfrenta uma profunda crise económica e financeira, decorrente da forte quebra na procura turística – setor que garante 25% do Produto Interno Bruto (PIB) do arquipélago – desde março de 2020, devido à pandemia de covid-19.

Em 2020, registou uma recessão económica histórica, equivalente a 14,8% do PIB, seguindo-se um crescimento de 7% em 2021 impulsionado pela retoma da procura turística. Para 2022, devido às consequências económicas da guerra na Ucrânia, nomeadamente a escalada de preços, o Governo cabo-verdiano baixou a previsão de crescimento de 6% para 4%.

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