Utilizados como revestimento em dois dos mais movimentados complexos viários de Goiânia, os painéis de alumínio de ACM (em inglês, Aluminum Composite Material) deverão virar sucatas. O fogo provocado por um dependente químico no dia 15 último no elevado da T-63, atingindo parte das 600 peças, levou a administração municipal a anunciar a retirada de todas elas, que serão substituídas por arte urbana. Desde 2016 o POPULAR vem denunciando o perigo representado pelas placas, confirmado mais tarde em levantamento do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-GO).

Inaugurados respectivamente em 2007 e 2008, o Viaduto Latif Sebba, na popular Praça do Ratinho (Avenida 85), e o Viaduto João Alves de Queiroz, na antiga Praça Simão Carneiro de Mendonça (T-63), se transformaram em marco de Goiânia na segunda passagem de Iris Rezende Machado pelo Paço municipal, entre 2005 e 2008. Os monumentos instalados nos dois locais, assinados pelo arquiteto Sandro Carvalho, se tornaram referência e estão entre os mais fotografados da cidade.

A opção de uso das placas de ACM pela construtora Delta, responsável por ambas as obras, se mostrou inconveniente logo após a inauguração. Em diversos momentos parte dos painéis foi arrancada ou ficou instável pela força do deslocamento da massa de ar provocada pelo movimento dos veículos ou pelos esbarrões acidentais. “Acredito que, na época, o que se pensou foi que esta solução daria uma ideia de futurismo, mas esses painéis não são nada práticos” , afirma o presidente do Crea-GO, Lamartine Moreira.

Em março de 2012, o POPULAR mostrou que as placas do elevado da T-63 já tinham caído sete vezes, causando preocupação nos motoristas, ocorrências que começaram dois dias após a inauguração, em dezembro de 2008. Em 2013, após relatos de que alguns painéis tinham atingido veículos, a Prefeitura fez a substituição de algumas peças, o mesmo ocorreu em 2015. Em dezembro de 2016, o jornal voltou a mencionar o assunto, quando registrou novas avarias no complexo viário na confluência das avenidas T-63, 85 e S-1.

Diante das inúmeras reclamações, a Secretaria de Infraestrutura Urbana (Seinfra) em 2018 fez a troca de cem placas de ACM em cada um dos complexos, tanto na Praça do Ratinho, quanto na T-63. Em março de 2019, o Crea-GO, junto com profissionais da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) e do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de Goiás (Ibape) divulgaram um relatório apontando 230 problemas em 68 pontes e viadutos da capital. As placas de ACM foram um dos danos mencionados.

“Em 2019 nós entregamos esse relatório para a Prefeitura de Goiânia. Esses problemas já vinham se arrastando. Muito tempo antes o Crea-GO já tinha questionado o fato de a estrutura de concreto não ter ficado à vista, para facilitar a manutenção. As manifestações patológicas podem surgir e, se ficam enclausuradas, não são observadas”, detalha Lamartine Moreira. O engenheiro Ricardo Ferreira, que coordenou o estudo, disse na ocasião que “Goiânia era a única cidade do mundo que reveste obras de arte especiais (OAEs)”. Para ele, a ideia é um equívoco por impedir a fiscalização de manchas, fissuras e corrosões.

Os dois complexos viários custaram aos cofres municipais R$ 25 milhões, sem mencionar as manutenções exigidas depois. Em média, uma placa de ACMl de 1,50×5,00 metros, custa hoje 700 reais. Em abril deste ano, um caminhão, com altura acima do permitido, arrancou alguns painéis do viaduto da T-63, obrigando a interdição do tráfego para reparar o dano. Somente depois do incêndio da madrugada do dia 15, que atingiu boa parte do elevado, o prefeito Rogério Cruz (Podemos) anunciou a retirada em definitivo das placas dos dois complexos (os únicos de Goiânia onde elas foram instaladas) para dar lugar à arte urbana. E, ao que tudo indica, esse volume de painéis não terá aproveitamento futuro.

Trânsito no elevado será liberado no dia 11

Placas de ACM, compostas de duas chapas externas de alumínio com um núcleo de polietileno, são comumente utilizadas para comunicação visual e também revestimento em construção civil. São consideradas leves, resistentes e moldáveis. O Crea-GO reforça que o uso foi inadequado nos complexos que integram o sistema de mobilidade urbana. “Obras de arte precisam de atenção. A administração pública não pode esquecer que a malha viária está ficando antiga e requer manutenção”, afirma Lamartine Moreira. 

Segundo o presidente do Crea-GO, as placas que serão retiradas não têm condições de reaproveitamento e, muito provavelmente, vão virar sucatas. Em nota ao POPULAR, a Seinfra explicou que, por enquanto, elas serão guardadas num depósito da pasta e “até o momento não têm destinação de aproveitamento”. Desde o dia 16, um dia após o incêndio, operários da secretaria trabalham na retirada das 600 placas do complexo viário, operação que deve continuar até o dia 10 de agosto. Ainda não há previsão para a retirada dos painéis da Praça Latif Sebba.

A Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM) informou que a liberação para o tráfego no elevado da T-63, interditado desde o dia do incêndio, só irá ocorrer após o término das obras conduzidas pela Seinfra. Na segunda-feira (25), parte do bloqueio amanheceu rompido e exigiu novos reforços da SMM. Embora laudo técnico tenha confirmado que o concreto não ficou comprometido, os pilares serão reforçados com argamassa especial. A Seinfra confirmou que o elevado será liberado para o tráfego no dia 11 de agosto.

Além de sediarem os monumentos criados por Sandro Carvalho, os complexos viários das avenidas 85 e T-63 vão integrar o Projeto Arte Urbana, coordenado pela Secretaria Municipal de Cultura (Secult). A proposta visa a ilustrar espaços públicos, promovendo artistas, previamente cadastrados, por meio do grafite e de outros tipos de pinturas. Até o momento, o projeto recebeu investimentos de R$ 500 mil e pode ser conferido no complexo viário Jamel Cecílio e no viaduto Iris Rezende Machado, inaugurados em maio e junho deste ano, e no Beco da Codorna, no Centro de Goiânia. 

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